Caixas desabastecidos e filas excessivas em banco geram dano moral coletivo

Por Danilo Vital

A inadequada prestação de serviços bancários, caracterizada pela reiterada existência de caixas eletrônicos inoperantes, sobretudo por falta de numerário e pelo consequente excesso de espera em filas, é apta a caracterizar danos morais coletivos.

Com esse entendimento, a 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça manteve a condenação do Banco do Brasil e do Bradesco ao pagamento de R$ 500 mil cada, a título de danos morais coletivos, pelos serviços mal prestados na cidade de Araguaína (TO).

A ação foi ajuizada pelo Ministério Público tocantinense devido ao fato de ambas as instituições manterem caixas eletrônicos desabastecidos, o que gerou transtornos e filas com tempo de espera excessivo para atendimento dos clientes.

Em primeira instância, cada instituição financeira foi condenada a pagar R$ 10 milhões por danos morais coletivos. O Tribunal de Justiça do Tocantins manteve a condenação, mas reduziu o montante a R$ 1 milhão, a ser dividido entre os dois bancos.

Ao STJ, Banco do Brasil e Bradesco defenderam, entre outros pontos, que é ilegal a condenação ao pagamento de danos morais coletivos, haja vista que a demanda discute direitos individuais homogêneos. Também afirmaram que seria necessária a comprovação do dano.

Por unanimidade, a 3ª Turma do STJ negou provimento aos recursos. Relatora, a ministra Nancy Andrighi aplicou a teoria do desvio produtivo ao entender que a perda do tempo útil do consumidor leva à responsabilização das instituições pelos transtornos causados.

Tempo é dinheiro
Para a relatora, é irrelevante o número de pessoas concretamente atingidas pelo serviço mal prestado pelos bancos, pois a jurisprudência do STJ indica que o dano moral coletivo ocorre quando a conduta gerar grave lesão a valores e interesses coletivos fundamentais de forma intolerável.

Destacou que o caso julgado não se refere a meras espera em filas de agências bancárias. O que se registrou foi a reiterada existência de caixas eletrônicos inoperantes pela falta de dinheiro em espécie e o consequente excesso de espera em filas por tempo superior ao estabelecido em legislação municipal.

Isso gera a perda de tempo útil do consumidor, o que permite a aplicação da teoria do desvio produtivo. Essa teoria, uma criação do advogado Marcos Dessaune, inclusive foi primeiro reconhecida em acórdão da 3ª Turma do STJ, em caso julgado em 2019.

“A inadequada prestação de serviços bancários, caracterizada pela reiterada existência de caixas eletrônicos inoperantes, sobretudo por falta de numerário, e pelo consequente excesso de espera em filas por tempo superior ao estabelecido em legislação municipal, é apta a caracterizar danos morais coletivos”, concluiu a relatora.

Tempo útil
Marcos Dessaune classificou o julgamento do STJ como uma “nova decisão paradigmática” e elogiou o fato de a decisão ter aplicado a teoria “com extrema perspicácia e acerto”.

Fez apenas uma ressalva: considera inadequada a nomenclatura “tempo útil” ou “tempo livre”, usada para caracterizar o desperdício gerado pelos serviços mal prestados aos consumidores.

“Denominá-lo ‘útil’ implicaria reconhecer que existe algum tempo inútil na vida humana, o que não é concebível. E chamá-lo de ‘livre’ desconsidera que todo o tempo de vida é ‘ocupado’ — do ócio ao negócio. Na teoria do desvio produtivo, que é a doutrina pioneira na tratativa dessa temática, prefiro denominar esse ‘novo’ e precioso bem jurídico de ‘tempo vital ou existencial’ — ou simplesmente ‘tempo'”, afirmou.

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REsp 1.929.288

Fonte: Conjur